A terapeuta sexual americana já levou 900 homens ao orgasmo e mostrou a eles como agradar uma mulher. Sua história rendeu um livro e o filme As Sessões, recém-lançados no Brasil. No cinema, ela é interpretada por Helen Hunt. Aqui, trechos do livro e uma entrevista com essa militante do prazer que radicalizou a ideia de que sexo ensina, cura, alegra. E pode até inspirar amor.
“Tive mais de 900 parceiros sexuais. Não fiz sexo com todos eles, mas fiz com a maioria.” As primeiras linhas do livro "As Sessões", que conta a história da terapeuta sexual americana Cheryl Cohen Greene, recém-lançado no Brasil pela editora BestSeller, chocam pela franqueza. Mas não se engane: este não é um livro erótico e, sim, sobre erotismo. A autora revela-se uma mulher doce e apaixonada pela vida, que defende o sexo livre como forma de aumentar o autoconhecimento e a qualidade da intimidade entre parceiros. Terapeuta sexual há mais de 40 anos – aos 68 ela continua na ativa – Cheryl nasceu na cidade de Salem, em Massachusetts, e logo na adolescência descobriu como o mundo poderia ser cruel com mulheres que, como ela, gostam de sexo.
Nos anos 1950, foi chamada de “tarada” por namorados e reprimida por pais católicos. Superou a culpa cristã aos 19 anos, quando conheceu Michael, o pai de seus dois filhos, um filósofo libertário, com quem, no início dos anos 70, viveu um casamento aberto e mudou-se para a Califórnia. Ali, tornou-se terapeuta sexual, adotando métodos dos sexólogos pioneiros William Masters e Virginia Johnson, que inclui relacionar-se intimamente com os clientes. Com um deles, Bob, casou-se antes de se separar de Michael e vive há 30 anos uma relação feliz e, hoje, monogâmica.
Um capítulo da incrível história de Cheryl também virou filme. O diretor Ben Lewin baseou-se em um artigo do poeta Mark O’Brien, um cliente paralítico que perdeu a virgindade aos 36 anos com a terapeuta. Interpretada no cinema por Helen Hunt - indicada ao Oscar deste ano de melhor atriz coadjuvante –, Cheryl ganhou fama instantânea e muitos elogios da estrela: “Ela irradia uma visão humanista sobre o corpo e tudo o que ele é capaz de fazer. Acha uma aventura ver os netos crescendo, ajudar alguém a ter um orgasmo ou fazer um filme”, disse Helen durante o lançamento do longa. A mesma visão franca e libertária de Cheryl aparece na entrevista que ela concedeu por telefone à Marie Claire e nos trechos que selecionamos de seu livro. Confira.
RECHO DO LIVRO: “Qual a diferença entre você e uma prostituta?’ Esta é a pergunta que mais ouço. Às vezes, ela é feita timidamente; outras, soa como uma acusação disfarçada (…). Procurar uma prostituta é como ir a um restaurante. Você escolhe algo do cardápio, come e, depois que vai embora, o proprietário espera que volte e recomende o lugar aos amigos. Consultar um terapeuta do sexo é como ir a uma escola de culinária. Você aprende as receitas, desenvolve suas habilidades, amplia seu paladar e, em seguida, sai pelo mundo com seu conhecimento recém-adquirido. Se tudo correr bem, você cria refeições deliciosas, repetidas vezes, para degustadores selecionados.”
MARIE CLAIRE Como se sentiu ao compararem sua profissão de terapeuta sexual a de prostituta?
CHERYL COHEN Sinto apenas que preciso explicar a diferença, pois muitas pessoas concluem que eu simplesmente recebo dinheiro para fazer sexo. Respeito as prostitutas, mas estar com uma delas significa aproveitar o prazer do momento. Minha intenção é outra. Meus clientes chegam confusos, com medo, ansiosos. Eu ensino o que éuma vulva, por exemplo, informo sobre sexo seguro e, sobretudo, proponho exercícios para que conheçam o próprio corpo, descubram o que dá ou não prazer
TRECHO DO LIVRO: Durante minha carreira, tive clientes de todos os tipos e classes econômicas.O mais jovem deles tinha 18 anos, e o mais velho, 89. Eles são presidentes de empresas, motoristas de caminhão, advogados, carpinteiros. Alguns são lindos, outros têm uma aparência normal. Trabalhei com um septuagenário virgem, um universitário que sofria de ejaculação precoce e homens de todas as idades, muitos se queixam de impotência ou não sabem como se comunicar na esfera sexual (...).”
MC Como os pacientes chegam até você?
CC Eu não os chamo de pacientes, pois isso indicaria que estão doentes. Prefiro chamá-los de clientes. Eles sempre chegam por meio de um terapeuta licenciado e nós trabalhamos juntos durante todo o processo: os clientes me encontram numa semana, na outra vão ao psicoterapeuta. Após cada sessão, eu reporto ao outro profissional tudo que aconteceu e planejamos o que vamos fazer na próxima semana.
RECHO DO LIVRO: Em Berkeley, eu servia de modelo para alunos da escola de arte local e para alguns artistas experientes. Comecei a desenvolver, primeiro, uma aceitação e, posteriormente, uma apreciação por meu corpo. De vez em quando, via lampejos de excitação nos rostos dos artistas, o que me surpreendia e deliciava. Meu corpo não mudara, mas minha percepção dele certamente estava mudando. Quando olhava para as pinturas e desenhos que faziam de mim, via-o através dos olhos dos artistas. As gorduras que julgava tão horríveis, na verdade, começavam a me parecer atraentes. (...) Estava fazendo as pazes com meu corpo, que eu considerara um infortúnio por muito tempo. Pela primeira vez, comecei a pensar que a noção de beleza não era fixa e como a ideia de um corpo perfeito era instável.”
MC A idade afetou a libido? Considera-se sexy?
CC Aos 68 anos, minha vida sexual não está no comando, eu estou no comando! E hoje, quando faço sexo, estou muito mais presente. Eu e meu marido somos tão felizes, que não acho que estamos descendo ladeira abaixo e, sim, que vivemos uma nova fase. É claro que enfrentamos desafios, superei o câncer duas vezes, passei por uma reconstrução de seio, mas sempre voltei para a minha sexualidade, porque isso me afirma como ser humano. Outro dia, um jornalista inglês insistia em me perguntar como alguém poderia me achar sexy aos 68 anos. Sinto muito por ele, mas aos 80 espero explorar novas facetas da minha libido.
TRECHO DO LIVRO: Assim como muitos pedófilos, Bradley fora sexualmente abusado na infância por um homem da família (...). Ele concordara como tratamento, reportava-se ao funcionário que acompanhava sua liberdade condicional regularmente e não havia indicação de que cometera outro crime. (...) Quando ele chegou, estava determinada a fazer o melhor que podia. No entanto, ao abrir a porta e ver aquele homem magro e de cabelos negros, senti calafrios. Ele era, em uma palavra, horripilante. Fiz perguntas
superficiais (...). Descrevi o processo da terapia (...). Em seguida, chegou a hora de ir para o quarto. Senti um frio no estômago (...). Uma voz em minha cabeça gritava: ‘Saia daí imediatamente’.”
superficiais (...). Descrevi o processo da terapia (...). Em seguida, chegou a hora de ir para o quarto. Senti um frio no estômago (...). Uma voz em minha cabeça gritava: ‘Saia daí imediatamente’.”
MC A sessão com um pedófilo relatada no livro foi a sua pior experiência?
CC Sim, ele foi o único paciente que me assustou de verdade. Assim que começou a falar sobre o que tinha feito no passado, foi horrível. Eu e sua outra terapeuta sabíamos que ele havia molestado uma criança, mas na sessão ele contou que foram várias e que havia uma garota que ele estava perseguindo naqueles dias. Eu ouvi o que ele disse e encerrei a consulta. Nós o denunciamos à polícia e ele foi preso.
TRECHO DO LIVRO: Em 31 de outubro de 1981, Bob e eu fomos de carro até Reno e nos casamos. A cerimônia foi realizada por uma juíza de paz. Ela leu uma bênção de casamento dos índios nativos americanos (...). Fomos para o hotel Harrah’s e o sexo foi um dos melhores das nossas vidas. (...)O compromisso que Bob e eu tínhamos um como outro era inabalável e, agora, oficial — bem, mais ou menos. Não podia ser legal, porque eu ainda estava casada com Michael. (...) Ele ficou furioso, mas não me importei. Eu sofrera a humilhação de saber sobre sua família extraconjugal e, se ele estava zangado porque eu me casara pela segunda vez, azar o dele. (...)”
MC Como foi o seu primeiro casamento, com Michael? Era um típico relacionamento aberto dos anos 70?
CC Meus filhos eram pequenos nessa época, eu não queria abrir o casamento nem perder meu marido. Eu o amava e ele não estava interessado em ficar só comigo, então, acabei aceitando. Vivi um casamento aberto por quase 30 anos, mas eu só namorei com outras pessoas por um ano e meio, mais ou menos. Eu e Michael nos separamos em 1992. Saí desse casamento com o coração partido, pois ele rompeu nosso acordo e teve filhos de uma namorada. Isso foi devastador para mim, embora eu já estivesse com Bob há 11 anos, desde que terminamos sua terapia.
TRECHO DO LIVRO: Bob já não era mais meu cliente (...) e passáramos horas absorvidos no sexo maravilhoso (...). Eu esperava algo fantástico, mas o que tive foi o sublime. Com os olhos e membros colados em um abraço passional, gozamos juntos pela primeira vez (...). Começar um relacionamento amoroso com um ex-cliente era arriscado, mas nossos caminhos se cruzaram, o momento era certo e, sem dúvida alguma, valeu a pena correr o risco.”
MC Algum cliente já se apaixonou por você?
CC Isso acontece com uma certa frequência, porque, mesmo que eu não transe com cliente, meu trabalho é evocar sentimentos, fazer que eles expressem e entendam sua sexualidade. Quando eles se declaram, eu digo: “Compreendo o seu amor, você nunca fez isso com outra mulher, nunca tocou ou foi tocado e é ótimo que você se sinta assim”. Mas eu sempre lembro que o número de sessões é limitado (de seis a oito, geralmente), e ao final de cada uma, converso como terapeuta do cliente, para que esses sentimentos sejam trabalhados. A emoção não me assusta, ela faz parte do processo terapêutico. E eu também posso me envolver, me apaixonar. Tanto que me casei comum dos meus clientes! Bob e eu estamos juntos há 30 anos.
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